A Festa da Carne de Sol de Picuí ganhou recentemente o reconhecimento formal como patrimônio cultural imaterial da Paraíba, o que coloca o evento não apenas como celebração gastronômica, mas também como instrumento de política cultural. Esse reconhecimento confere à festa uma dimensão institucional e simbólica: o poder público ao oficializar esse tipo de ação reforça estratégias de identidade regional, de fortalecimento comunitário e de visibilidade local. Assim, a iniciativa se transforma em elo entre cultura e política, valorizando o município de Picuí no contexto estadual e nacional.
Quando um governo reconhece uma manifestação tradicional como patrimônio imaterial, ele realiza uma escolha política: define qual memória será valorizada, qual território receberá atenção e quais práticas serão preservadas. No caso da Festa da Carne de Sol de Picuí, essa escolha destaca a tradição sertaneja, rural, ligada à carne de sol, e atribui valor institucional a algo que por décadas foi mantido pela comunidade. Esse ato de reconhecimento implica recursos, visibilidade, orgulho local — e por consequência, mobilização de atores políticos e culturais.
Além disso, integrar essa festa ao calendário oficial traz impactos concretos. Em um município como Picuí, no interior da Paraíba, a festa impulsiona o turismo, atrai investimentos, movimenta a economia local e favorece a participação de produtores, comerciantes, prestadores de serviços. Na política, essa dinâmica fortalece as redes locais de apoio, favorece o protagonismo municipal e pode alterar o equilíbrio entre o centro e o interior. Ao apoiar a festa, gestores demonstram compromisso com o desenvolvimento regional, o que reforça legitimidade política.
A festa também se tornará espaço de articulação social e cultural que reflete escolhas públicas, orientações de governo e visões de futuro. O processo de reconhecimento exige instâncias de gestão, normativas, participação comunitária — e isso provoca debates sobre quem representa a tradição, como se preserva, quem se beneficia. Em Picuí, a oficialização da Festa da Carne de Sol cristaliza uma agenda de cultura que conecta saberes antigos, economia local e políticas públicas. Essa interligação entre cultura e governo representa um novo momento para o município.
Em termos de imagem política, celebrar esse patrimônio fortalece a identidade coletiva e oferece narrativa para políticos e lideranças locais. A festa deixa de ser somente um evento anual e passa a figurar como símbolo da cidade e de suas raízes. Isso traz efeitos sobre o voto, sobre a mobilização de base, sobre a coesão social. Quem se apresenta como guardião ou promotor da festa comunica compromisso com a comunidade, com a tradição, com a valorização do interior — e isso gera capital político.
Outra faceta importante refere-se ao papel da gastronomia como política cultural e territorial. A carne de sol, enquanto elemento central da festa, mobiliza saberes de agricultores, de cozinheiros, de artesãos. Na Paraíba, ao valorizar essa tradição específica de Picuí, as políticas culturais passam a reconhecer que a cultura alimentar também é instrumento de desenvolvimento e de visibilidade. Assim, a festa não é apenas entretenimento — torna-se mecanismo de promoção das pequenas economias e de inclusão territorial.
Cabe ainda destacar como o reconhecimento pode suscitar desafios políticos: preservação vs. comercialização, tradição vs. modernização, comunidade vs. turismo de massa. Em Picuí e no estado da Paraíba, equilibrar essas tensões será fundamental. As lideranças devem delinear políticas que garantam que a festa beneficie a comunidade local e não seja apenas palco para negócios externos. A política aqui passa por estabelecer governança, transparência, participação — para que o patrimônio cultural imaterial seja vivido, reconstruído e compartilhado.
Por fim, essa transformação de evento local em patrimônio cultural imaterial faz da Festa da Carne de Sol de Picuí um caso emblemático de política cultural no interior. Em vez de permanecer isolado, o município dialoga com o estado e com a nação, inscrevendo suas tradições no âmbito público e institucional. O reconhecimento fortalece a cidade, valoriza sua história, mobiliza recursos e posiciona Picuí como protagonista dentro da política cultural da Paraíba.
Autor: Carye Ulaan

